Sabemos que não basta que o Brasil queira se comprometer com um documento internacional para que ele já comece a produzir efeitos no território nacional. Até porque, como Estado soberano, possuímos nosso próprio procedimento para criação de ordens jurídicas. Isso faz com que não baste que o Estado brasileiro queira se obrigar em relação a algum tratado internacional, é necessário que haja o preenchimento de alguns requisitos.
De uma forma didática, podemos pensar em fases, etapas, iter (caminho) de formação dos tratados internacionais de direitos humanos, que necessariamente deverão ser percorridas, para que seja possível que o Brasil seja obrigado a cumprir suas disposições – e também para que sejamos fiscalizados na ordem internacional!
Podemos fazer a divisão em 4 fases: (1) fase de negociação e assinatura; (2) referendo congressual; (3) ratificação e (4) promulgação e publicação.
A fase de negociação e assinatura é a fase inicial. São as primeiras tratativas, quando o Estado brasileiro terá o primeiro contato com esse documento, assim como outros Estados o farão.
O simples ato de negociar é olhar, ver se aquele tratado é compatível com os interesses do Estado brasileiro, com o que o país está precisando no momento. Se for interessante para o Brasil, é possível que o Presidente da República assine o tratado internacional. Essa assinatura é chamada de aceite precário. Como o próprio nome indica, este aceite não é definitivo.
Trata-se de uma manifestação de vontade do Brasil de participar, pelo menos em um momento inicial, embora ainda não esteja se obrigando ao texto do tratado, ou seja, o Brasil ainda não está vinculado, a mera assinatura do tratado internacional não gera efeitos jurídicos. Gera, no máximo, um mal estar no caso de descumprimento.
Apesar de se tratar de uma competência privativa do Presidente da República, a Constituição, em seu art. 84, VIII, permite que haja delegação do Presidente a outras pessoas.
Essas tais pessoas são conhecidas como plenipotenciários, que são autoridades, geralmente diplomatas, Ministros de Estado, que poderão assinar o tratado internacional pelo Presidente da República, desde que possuam a Carta de Plenos Poderes, que será assinada pelo próprio Presidente e também referendada pelo Ministro das Relações Exteriores.
Após a primeira fase, de negociação e assinatura, que ocorre no plano internacional, o tratado vem para o território nacional e passa a ser analisado por nossos parlamentares.
A segunda fase, de referendo congressual, também é chamada de referendo do Congresso Nacional e referendo parlamentar. Neste momento, haverá a análise por parte do Congresso Nacional, os membros do Senado Federal e a Câmara dos Deputados analisarão por meio de um referendo aquele tratado que foi assinado no plano internacional.
O Congresso Nacional poderão dizer “não”, e interromper o andamento dessa negociação, por entender que o Estado brasileiro não está precisando desse tratado, ou poderá dizer “sim”, emitindo, em regra, um decreto legislativo, nos termos do art. 49, I da Constituição:
Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional:
I – resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional;
Em um terceiro momento, teremos a ratificação. Ratificação, como o próprio nome já indica, é um ato de confirmação. Se o Estado brasileiro ratificar um tratado internacional – se for um tratado multilateral será necessário um depósito – ele estará confirmando o seu interesse em participar daquele documento internacional.
Apenas o Presidente da República pode ratificar um tratado internacional, sendo uma competência exclusiva, não podendo delegar essa atribuição a quem quer que seja. A ratificação é um ato gravoso, que pode gerar consequências jurídicas intensas, por isso, apenas o Presidente da República, figura máxima do Estado, é que poderá fazer esse comprometimento.
É importante ressaltar que o Presidente não é obrigado a ratificar o tratado internacional. Ele estará pautado ao princípio da discricionariedade, ou seja, fará uma análise de conveniência e oportunidade em relação à ratificação daquele tratado. Pode ser, a título de exemplo, que o cenário político do Brasil se alterou e não seja mais interessante a incorporação daquele tratado, ou seja, o Brasil pode desistir nesse momento.
Se o Presidente da República optar por prosseguir, ratificando aquele documento internacional, passam a ser produzidos efeitos externos e, a partir de então, o Brasil se obriga no cenário internacional, ou seja, caso haja descumprimento das diretrizes firmadas no tratado, o Estado brasileiro pode sofrer sanções na seara internacional.
A negociação de um tratado internacional leva tempo, até porque envolve uma questão política muito forte. Normalmente, essa tramitação dura vários anos, podendo, inclusive, ser um outro Presidente da República, diferente daquele que participou das fases iniciais de negociação e assinatura.
Como a ratificação, o Estado brasileiro assume obrigações quanto ao tratado internacional, perante o ordenamento jurídico externo. Aqui, há confirmação do texto que anteriormente foi analisado, negociado, assinado, passou pela aprovação do Congresso Nacional e finalmente foi confirmado na ordem jurídica.
A quarta e última fase é a da promulgação e publicação. A partir desse momento, o Brasil vai se obrigar internamente a cumprir esse tratado internacional, pois surgem efeitos internos. A nossa própria legislação terá que se adequar às diretrizes daquele tratado internacional. Ocorrerá com a publicação no Diário Oficial da União.
O tratado internacional de direitos humanos pode entrar para nossa ordem jurídica de duas formas: caso seja submetido ao mesmo procedimento das emendas à Constituição, terão status equivalente a norma constitucional – ou seja, votação em dois turnos, nas duas Casas, com aprovação de no mínimo ⅗ dos votos – ou, caso não siga tal trâmite, extremamente difícil de ser atingido, será incorporado em nossa ordem jurídica com status supralegal, ou seja, acima da legislação ordinária federal, mas abaixo das normas Constitucionais.