A necessidade de conscientização sobre o tema
Acompanhe nosso bate-papo a respeito:
Mari
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Amanhã será publicado aqui no site um artigo meu a respeito da conta que não fecha quando falamos em números de crianças cadastradas para adoção e o número de candidatos a adotantes. Mas, darei um panorama da questão.
O prazo máximo de permanência de crianças e adolescentes em instituições de acolhimento é de 18 meses, conforme se verifica no atual § 2º, art. 19/ECA. Contudo, temos, conforme dados de 05/12/2020, 30.571 crianças e adolescentes em acolhimentos institucionais no Brasil. Dessas crianças e adolescentes, apenas 5.166 estão aptas para adoção e inseridas no sistema do Conselho Nacional de Justiça para que famílias aptas a adotar as encontrem.
Imagine passar sua infância e/ou sua adolescência institucionalizado? Por mais que existam pessoas incríveis e dispostas a trabalharem por esses jovens, nada disso supre uma família. É incrível quando se trabalha como voluntário em um acolhimento e você pode testemunhar uma criança que entre no programa de apadrinhamento familiar – em que famílias se cadastram para cuidar e zelar por um jovem que está acolhido, passando o final de semana com ele ou ela, acompanhando em médicos, na escola – como a sensação de pertencimento, o amor e o acolhimento familiar mudam aquela criança!
O Estatuto da Criança e do Adolescente não está errado em insistir tanto em não manter essas crianças e adolescentes nos acolhimentos, não é o lugar deles. A ideia do acolhimento é ACOLHER TEMPORARIAMENTE, ser um local de passagem rápida na vida de uma pessoa. Contudo, o que vemos é que muitos jovens passam quase a vida inteira lá e saem aos 18 anos sem ter um referencial de família.
E é aí que a adoção entra, como instrumento para que essas crianças e adolescentes encontrem a sua família que a vida presenteou. Muitas vezes escutamos histórias lindas que parecem reencontros, como se aquela família tivesse que existir de alguma forma com aquela criança ou adolescente. É incrível!
Agora, como eu disse, as coisas não são tão simples assim e nossa cultura cria uma forte barreira para que essas histórias sejam concretizadas.”
Clara
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Uma das grandes barreiras que encontramos nesse sistema de adoção é que, na maioria das vezes, os adotantes possuem critérios incompatíveis com a maioria das crianças em acolhimento. Um dos critérios mais usados e um dos mais intransponíveis é o critério do limite de idade. A maioria dos adotantes quer adotar uma criança de até 6 anos de idade. Mas a maioria das crianças e adolescentes no sistema são maiores de 7 anos de idade.
Ainda, quanto mais vamos afunilando com os requisitos de cada adotante, menos compatibilidade há entre as crianças disponíveis e os adotantes. Por exemplo, de acordo com os dados do CNJ que a Mari citou no artigo dela, boa parte dos adotantes não quer adotar crianças não brancas, com irmãos, ou com qualquer tipo de deficiência física. Assim, essas crianças acabam permanecendo no sistema de acolhimento até atingirem a maioridade, sem conhecer o sentimento de pertencimento.
E aí entra um ponto importante a ser discutido: até onde os preconceitos estruturais na nossa sociedade impedem que crianças vivam um dos fundamentos mais básicos do que é ser uma pessoa, que é o se sentir parte de uma família”.
Nina
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Clara, o que você disse é algo que devemos colocar um holofote! O ECA nos traz que há prioridade no cadastro de adoção para aquelas pessoas que tiverem interesse em adotar criança ou adolescente com deficiência, doença crônica, necessidades específicas de saúde e grupo de irmãos.
O motivo para isso é óbvio: demanda mais trabalho, mais atenção e por conta disso os candidatos são poucos. O Estado, por meio da legislação protetiva, busca incentivar as pessoas que estejam dispostas a sair um pouco do padrão do que é rotineiramente procurado nas adoções e que decidam dar uma chance para crianças e adolescentes que, assim como quaisquer outras, precisam de afeto e amor.
Mari, você também está extremamente certa ao falar no grande interesse do Estado e da sociedade em deixar crianças e adolescentes em situação de acolhimento na maior brevidade possível. Realmente, é uma situação que deveria ser temporária, embora não seja o que verificamos na prática.
A intenção é, sempre que possível, reintegrar aquela criança ou adolescente em seu núcleo familiar (família natural) ou na sua família extensiva (ampliada), que vai além da unidade pais e filhos ou da unidade do casal, mas também abrange parentes próximos com os quais a criança ou adolescente convive e mantém vínculos de afinidade e afetividade
Nem sempre, infelizmente, isso é possível, pelas mais variadas situações. De toda forma, é uma obrigação do governo e também nossa, de fiscalizar, cobrar e proteger os direitos das crianças e dos adolescentes, para que recebam o melhor tratamento possível enquanto institucionalizadas e que, assim que possível, a criança ou adolescente seja acolhida por uma família, sendo reintegrada de forma eficiente à sociedade.
Ainda bem que temos lugares lindos e incríveis que realizam trabalhos de apoio e apadrinhamento, como citado por vocês, meninas, mas sabemos que nem todas as pessoas sujeitas ao sistema dão a mesma sorte. Por isso, é tão importante o mecanismo da adoção, para situações em que a reconstituição do laço familiar biológico seja realmente inviável, permitindo novas oportunidades e uma vida feliz para essas pessoas que já sofreram tanto, mesmo sendo tão jovens”.