Nenhuma história de violência doméstica começa com um tapa no primeiro encontro

A maioria delas começa com uma mulher apaixonada por um homem. Esse homem não é agressivo desde o início, ele é romântico, apaixonante, charmoso. Por isso, MUITO CUIDADO ao culpar uma vítima de violência doméstica: Ela não sabia o que estava por vir.

Maria da Penha viveu uma história assim. Se casou com seu namorado, Marco, um homem que se mostrava ser amoroso e solidário, colombiano e mestrando em economia. O casal teve três filhas.

MAS, TUDO COMEÇOU A MUDAR…

Após Marco se estabilizar profissionalmente e conseguir a cidadania brasileira, as agressões começaram. Suas reações eram explosivas com Maria e suas filhas, e a violência começou a escalar em frequência e força.

O ciclo de violência, que já falamos a respeito aqui, se desenhava de forma clara: tensão, violência, arrependimento e carinho. É nessa fase final que Maria acreditava que seu marido voltaria a ser o homem com quem se casou.

Então, em 1983 Maria sofreu dupla tentativa de feminicídio.

medo e violência.

O marido de Maria atirou em suas costas, causando lesões em sua espinha, na dura-máter e em sua medula, tornando-a paraplégica.

Mas, Marco alegou para a polícia que aquilo havia sido consequência de um assalto, o que foi desmentido pela perícia. Quando Maria da Penha voltou para casa – após duas cirurgias, internações e tratamentos –, ele a manteve em cárcere privado durante 15 dias e tentou eletrocutá-la durante o banho.

Marco a obrigou a assinar procurações dando poder a ele, e ela se tornou refém da situação e sem apoio do Estado.

O APOIO DA FAMÍLIA e a falha do judiciário…

Conscientes do que estava acontecendo, a família de Maria buscou ajuda jurídica e a auxiliaram a deixar sua casa sem que isso configurasse abandono de lar e prejudicasse a guarda de suas filhas.

Mas, apesar de tudo que aconteceu, das provas produzidas pela polícia e de todas as consequências físicas e psicológicas que havia sofrido, o Judiciário falhou gravemente com Maria: o julgamento do caso aconteceu apenas 8 anos após os fatos e, apesar de condenado a 15 anos de prisão, em decorrência dos recursos de sua defesa, Marco saiu livre do Fórum.

A LUTA POR JUTIÇA.

O segundo julgamento aconteceu, a sentença foi reformada e a pena reduzida para 10 anos. Mais uma vez, a defesa de Marco conseguiu recorrer e mantê-lo em liberdade. Assim, em 1988, Maria da Penha denunciou o caso para a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos.

Ainda assim, o Estado permaneceu omisso durante o litígio internacional e em 2001 o Estado Brasileiro foi responsabilizado pela CIDH/OEA por negligência, omissão e tolerância em relação à violência doméstica sofrida por milhares de mulheres.

AS RECOMENDAÇÕES AO ESTADO BRASILEIRO:

A CIDH/OEA deu as segguintes recomendações ao Estado Brasileiro:

  1. Completar rapidamente e de forma efetiva o julgamento do caso de Maria da Penha;
  2. Promover a investigação dos motivos que levaram o caso a demorar tanto para ser julgado e de forma tão ineficiente, aplicando as medidas administrativas, legislativas e judiciárias aos responsáveis;
  3. Adotar, sem prejuízo das ações que possam ser instauradas contra o responsável civil da agressão, as medidas necessárias para que o Estado assegure à vítima adequada reparação simbólica e material pelas violações sofridas;
  4. Prosseguir e intensificar o processo de reforma que evite a tolerância estatal e o tratamento discriminatório com respeito à violência doméstica contra mulheres no Brasil.

A LEI 11.340/2006.

Então, após as recomendações e pressões dos órgãos externos, o Brasil se viu obrigado a encarar a dura realidade da violência doméstica contra a mulher no país.

Assim, em 2002, foi formado um consórcio de ONG’s Feministas para elaboração da Lei de combate à violência doméstica e familiar contra a mulher.

Após os trâmites legais e inúmeros debates promovidos nos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, o projeto de Lei foi aprovado em 2004 e sancionado pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2006.

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